sexta-feira, 7 de maio de 2021

A história de Miúcha, que contrai covid e se isola numa biblioteca

 Gazeta da Torre

A professora da USP Maria Luiza Tucci Carneiro se reinventa no confinamento e escreve conto baseado na pandemia

Com a linguagem de quem conhece muito bem o universo dos jovens estudantes, a professora Maria Luiza Tucci Carneiro, do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, se reinventa neste confinamento sem data para acabar. E atravessa a ponte das letras para trazer a história de Miúcha, que é, na verdade, a realidade que o planeta está enfrentando. A autora trava um desafio. Como trazer uma mensagem de otimismo e esperança diante das mais de 400 mil mortes no Brasil e cerca de 3 milhões no mundo? O resultado está no recém-lançado livro #Biblioteka Hotel: Um Conto da Quarentena – publicado pela Editora Intermeios -, escrito com cuidado e respeito ao drama de todos.

“O #Biblioteka Hotel nasceu sob o impacto da notícia de que estamos sendo atacados por um vírus invisível, ainda sem diagnóstico naqueles primeiros dias de janeiro de 2020”, conta a autora. “Fechei-me aqui na minha biblioteca, onde passo a maior parte do meu dia, pesquisando e escrevendo, para tentar digerir os fatos, dia a dia. Isolada, sem poder conversar e abraçar ninguém, resolvi escrever sobre esse fenômeno até então desconhecido por nós. Ouvindo as notícias sobre os jovens contaminados pelo coronavírus que retornavam do carnaval de Salvador e aqueles que se reuniam nos bares da Vila Madalena, sem perceber que estavam multiplicando o vírus, resolvi escrever para esse público.”

A história tem um recado para o leitor jovem, mas, na verdade, toca pessoas de todas as idades. “É uma criação ficcional, mas narrada durante a pandemia do coronavírus. A personagem principal, Miúcha, é contaminada e passa a viver a sua quarentena no espaço de uma biblioteca instalada nos fundos da residência familiar, localizada em um bairro boêmio da Pauliceia”, explica a autora. “Hóspede por 40 dias, a jovem tenta encontrar o seu equilíbrio mental e físico, movida por um sentimento de vazio, por sua memória afetiva e pelas alterações da natureza. As transformações do outono, além de marcar o tempo, sinalizam para a capacidade do ser humano de enxergar a vida de outros ângulos. Ao sair daquela vertigem momentânea da alma, Miúcha descobre um novo sentido para a vida.”

As ilustrações de Milena Issler compõem a inquietude da estudante confinada na biblioteca. Desenha Miúcha de jeans, camiseta, deitada no sofá, com mochila e livros no chão. Sem poder sair, espia a vida do celular. E, quando anoitece, descobre um casal de corujas que trata como novos amigos. Fica feliz quando ouve o avô, na cozinha, escutando no rádio a sua música preferida, Fascinação. Acorda com o café da manhã servido só para ela no jardim. Os desenhos vão fluindo junto com o texto. Uma parceria muito integrada entre Malu (apelido carinhoso da escritora) e Milena. Mãe e filha.

“Fiquei muito feliz em me dedicar a esse trabalho, criar a imagem da Miúcha e todo o seu  universo”, conta a ilustradora. “Revivi a história da família e me imaginei no lugar da personagem, presa e isolada dentro da biblioteca da minha mãe, onde cresci.” Participar da história foi a terapia de Milena, que buscou os afetos em cada traço, cada cor. “Desenhar, para mim, é uma maneira de colocar tudo para fora”, comenta.

Também para a professora Maria Luiza, escrever e compor a jovem de 17 anos foi buscar e rever a sua história. “Miúcha tem tudo a ver comigo, um pouco da minha neta, bastante dos meus filhos, dos meus alunos e com o meu ser e estar no mundo, hoje um mundo em crise e um Brasil sufocado pelo vírus, pela falta de oxigênio e pelo desgoverno de um presidente negacionista e despreparado para salvar vidas,” observa. “Tudo isso compõe o cenário do conto que, nas entrelinhas, traz uma mensagem universal centrada na capacidade que todo ser humano tem de transformação. Aqui está a essência da minha mensagem, que é de esperança calcada na coexistência e no respeito ao outro. Tem também, diria que muito, das minhas inquietações que costumam moldar os meus pensamentos e textos.”

#Bibliotheka Hotel: Um Conto da Quarentena, de Maria Luiza Tucci Carneiro, ilustrações de Milena Issler, Editora Intermeios, 48 páginas, R$ 38,00.

Fonte:Jornal da USP.

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