Gazeta da Torre
A professora da USP Maria Luiza Tucci Carneiro se
reinventa no confinamento e escreve conto baseado na pandemia
Com a linguagem de quem conhece muito bem o universo dos
jovens estudantes, a professora Maria Luiza Tucci Carneiro, do Departamento de
História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP,
se reinventa neste confinamento sem data para acabar. E atravessa a ponte das
letras para trazer a história de Miúcha, que é, na verdade, a realidade que o
planeta está enfrentando. A autora trava um desafio. Como trazer uma mensagem
de otimismo e esperança diante das mais de 400 mil mortes no Brasil e cerca de
3 milhões no mundo? O resultado está no recém-lançado livro #Biblioteka Hotel:
Um Conto da Quarentena – publicado pela Editora Intermeios -, escrito com
cuidado e respeito ao drama de todos.
“O #Biblioteka Hotel nasceu sob o impacto da notícia de
que estamos sendo atacados por um vírus invisível, ainda sem diagnóstico
naqueles primeiros dias de janeiro de 2020”, conta a autora. “Fechei-me aqui na
minha biblioteca, onde passo a maior parte do meu dia, pesquisando e
escrevendo, para tentar digerir os fatos, dia a dia. Isolada, sem poder
conversar e abraçar ninguém, resolvi escrever sobre esse fenômeno até então
desconhecido por nós. Ouvindo as notícias sobre os jovens contaminados pelo
coronavírus que retornavam do carnaval de Salvador e aqueles que se reuniam nos
bares da Vila Madalena, sem perceber que estavam multiplicando o vírus, resolvi
escrever para esse público.”
A história tem um recado para o leitor jovem, mas, na
verdade, toca pessoas de todas as idades. “É uma criação ficcional, mas narrada
durante a pandemia do coronavírus. A personagem principal, Miúcha, é
contaminada e passa a viver a sua quarentena no espaço de uma biblioteca
instalada nos fundos da residência familiar, localizada em um bairro boêmio da
Pauliceia”, explica a autora. “Hóspede por 40 dias, a jovem tenta encontrar o
seu equilíbrio mental e físico, movida por um sentimento de vazio, por sua
memória afetiva e pelas alterações da natureza. As transformações do outono,
além de marcar o tempo, sinalizam para a capacidade do ser humano de enxergar a
vida de outros ângulos. Ao sair daquela vertigem momentânea da alma, Miúcha
descobre um novo sentido para a vida.”
As ilustrações de Milena Issler compõem a inquietude da
estudante confinada na biblioteca. Desenha Miúcha de jeans, camiseta, deitada
no sofá, com mochila e livros no chão. Sem poder sair, espia a vida do celular.
E, quando anoitece, descobre um casal de corujas que trata como novos amigos.
Fica feliz quando ouve o avô, na cozinha, escutando no rádio a sua música
preferida, Fascinação. Acorda com o café da manhã servido só para ela no
jardim. Os desenhos vão fluindo junto com o texto. Uma parceria muito integrada
entre Malu (apelido carinhoso da escritora) e Milena. Mãe e filha.
“Fiquei muito feliz em me dedicar a esse trabalho, criar
a imagem da Miúcha e todo o seu
universo”, conta a ilustradora. “Revivi a história da família e me
imaginei no lugar da personagem, presa e isolada dentro da biblioteca da minha
mãe, onde cresci.” Participar da história foi a terapia de Milena, que buscou
os afetos em cada traço, cada cor. “Desenhar, para mim, é uma maneira de colocar
tudo para fora”, comenta.
Também para a professora Maria Luiza, escrever e compor a
jovem de 17 anos foi buscar e rever a sua história. “Miúcha tem tudo a ver
comigo, um pouco da minha neta, bastante dos meus filhos, dos meus alunos e com
o meu ser e estar no mundo, hoje um mundo em crise e um Brasil sufocado pelo
vírus, pela falta de oxigênio e pelo desgoverno de um presidente negacionista e
despreparado para salvar vidas,” observa. “Tudo isso compõe o cenário do conto
que, nas entrelinhas, traz uma mensagem universal centrada na capacidade que
todo ser humano tem de transformação. Aqui está a essência da minha mensagem,
que é de esperança calcada na coexistência e no respeito ao outro. Tem também,
diria que muito, das minhas inquietações que costumam moldar os meus
pensamentos e textos.”
#Bibliotheka Hotel: Um Conto da Quarentena, de Maria
Luiza Tucci Carneiro, ilustrações de Milena Issler, Editora Intermeios, 48
páginas, R$ 38,00.
Fonte:Jornal da USP.
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