Gazeta da Torre
O trabalho remoto, os serviços digitais e os encontros
virtuais, até a eclosão da pandemia de covid-19, eram práticas exóticas em todo
o mundo. Forçada pelo confinamento, a adesão aos recursos tecnológicos ocorreu
de forma acelerada e imersiva, mas com um importante detalhe: o seu alcance se
limita a uma pequena parcela da população que atua em profissões intelectuais e
criativas.
Desse modo, de acordo com o cientista-chefe do Instituto
de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio), Ronaldo Lemos, a
evolução tecnológica, caso continue avançando de forma concentrada, esconde, em
si, um risco de cisão social.
“Para este segmento
da sociedade [que trabalha em atividades cognitivas], o processo que a pandemia
desencadeou não tem mais volta. Pelo contrário, vai ser mais aprofundado, e
vamos viver cada vez mais sem a necessidade de ter a presença física”, assegura
Lemos, em entrevista ao UM BRASIL, uma realização da FecomercioSP. “Agora, para
o outro segmento da população – que é majoritário, não tem conectividade, não
são trabalhadores cognitivos, ou seja, trabalham com o próprio corpo ou
precisam fazer deslocamentos pelas cidades –, isso não vai acontecer”, alerta.
Lemos, também professor de Direito na Universidade
Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), diz que, no ápice do home office durante a
pandemia, apenas 12,7% dos trabalhadores brasileiros estavam cumprindo o
expediente em casa. Com isso, ele argumenta que a separação entre aqueles que
têm acesso irrestrito ao universo digital daqueles que pouco fazem uso dos
dispositivos tecnológicos pode agravar a questão da desigualdade social do
País.
“A pandemia acelerou este processo de transformação, mas
evidenciou e trouxe um desafio que já existia, que é a questão da desigualdade,
mas de forma muito mais radical, porque aqui tem o perigo de cisão mesmo – um
segmento da sociedade decola e vira espaçonave e outro fica para trás, aterrado,
sem as possibilidades que este que se deslocou da presença física vai ter”,
conjectura.
“Meu temor é que tenhamos uma divisão mesmo, até
cultural, entre duas novas classes, que passariam a ser mais demarcadas, com
modos de trabalho, vida, valores, interações culturais, desejos e aspirações
muito diferentes”, especula o professor.
De acordo com Lemos, além da inclusão digital, o Brasil
precisa de um plano para lidar com o avanço da automação gerado pelo
desenvolvimento de Inteligências Artificiais (IAs). Caso contrário, o País deve
perder muitos empregos no futuro.
“Se a gente puder resumir o desafio do Brasil em uma
única frase, seria a seguinte: precisamos aprender a transformar conhecimento
em valores econômico e social. O Brasil já é relativamente bom em transformar
recursos da natureza em valor econômico – fazemos isso no agronegócio e na
mineração. Mas, no mundo em que vivemos hoje, isso não é suficiente. Então, o
desafio do País é conseguir transformar conhecimento em produto, serviço e
desenvolvimento. Esta é a nossa tarefa”, frisa.
Fonte:UM Brasil
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