Gazeta da Torre
Em sessão remota nesta quinta-feira (3), o Plenário do
Senado aprovou o projeto que altera o Código de Trânsito, ampliando para 10
anos a validade da carteira de motorista (PL 3.267/2019). Foram 46 votos a
favor e 21 contrários, além de uma abstenção. De iniciativa do Poder Executivo,
a proposta foi aprovada na Câmara dos Deputados no final de junho. Como foi
modificado no Senado, o projeto retorna para nova votação na Câmara.
O projeto estabelece várias alterações no Código de
Trânsito Brasileiro (CTB — Lei 9.503, de 1997). Entre elas, a Carteira
Nacional de Habilitação (CNH) passará a ter validade de dez anos para
condutores com até 50 anos de idade. Hoje, a regra geral é de cinco anos de
validade. A proposta também estabelece cinco anos para condutores entre 50 e 70
anos de idade; e três anos para condutores com 70 anos ou mais.
O texto determina que os exames de aptidão física e
mental sejam realizados por médicos e psicólogos peritos examinadores e altera
regras para o uso da cadeirinha ou do assento de elevação, acrescentando
referências de peso e altura ao limite de 10 anos de idade. O projeto do
governo também estabelece regras mais brandas para a retenção da carteira e
para exames toxicológicos. Para a suspensão da carteira, o número de pontos pode
chegar a 40, conforme a situação — o dobro do que é hoje.
"Modernização"
O relator, senador Ciro Nogueira (PP-PI), afirmou que o
projeto tem um caráter de modernização da legislação de trânsito. Para o
senador, quanto mais redução na carga burocrática “que sobrecarrega os ombros
dos cidadãos comuns, mais reduziremos o custo Brasil, com reflexos positivos no
crescimento e no emprego”.
— Após quase 23 anos da aprovação do CTB, são necessárias
adequações a esse diploma, em função das rápidas mudanças que acontecem no trânsito
— argumentou o relator.
Ciro Nogueira destacou como um ponto de grande
importância o uso obrigatório das cadeirinhas infantis, que passa a fazer parte
do texto do CTB e não mais apenas de normas infralegais, como é atualmente. Ele
também destacou a regulamentação dos corredores de motos e lembrou que há um
grande crescimento desse tipo de transporte nos últimos anos no país. Ciro fez
ajustes redacionais no texto e informou que foram apresentadas 101 emendas ao
projeto, das quais ele acatou nove: três de redação e outras seis de mérito.
Com base em uma sugestão do senador Lucas Barreto
(PSD-AP), o relatório acatou a diferenciação de regras específicas para os
pneus de utilitários, como os jipes. Outra sugestão acatada, do senador Jean Paul
Prates (PR-RN) e também de Lucas Barreto, estabelece que a penalidade de
advertência, em substituição à multa, somente será aplicada uma única vez no
período de 12 meses. Não havia limite no texto original.
O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) também teve sua
sugestão acatada e o projeto passou a estabelecer como a infração o ato de
transportar ou manter embalagem de bebida alcoólica aberta no interior do
veículo. Outra emenda acatada, do senador Jorginho Melo (PL-SC), assegura ao
médico credenciado que, até a data de 10 de dezembro de 2012, tenha concluído e
sido aprovado em Curso de Capacitação, o direito de exercer o cargo de perito.
O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) também teve uma emenda acatada, mantendo
a pena de prisão hoje prevista na legislação para os casos de motorista
embriagado que tenha provocado acidente grave. O texto do governo previa
substituição de pena.
Os senadores Lasier Martins (Podemos-RS) e Eliziane Gama
(Cidadania-MA) apresentaram destaques para tentar aprovar suas emendas, também
para evitar abrandamento da legislação no caso de infrações de trânsito.
Submetidos a votação, porém, os destaques foram rejeitados.
Educação
O senador Eduardo Braga (MDB-AM) disse que o projeto tem
o mérito de flexibilizar a pontuação para a suspensão da carteira, partindo de
20 pontos, para quem tiver mais infrações graves, chegando até 40 pontos, para
quem tiver infrações leves. O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra
Coelho (MDB-PE), afirmou que a matéria foi enviada ao Congresso Nacional em
junho de 2019. Segundo o senador, foi um ano de debate na Câmara dos Deputados,
com seis audiências públicas, com a participação da sociedade brasileira. Ele
destacou que o projeto é importante, por exemplo, para motociclistas
profissionais, que terão mais garantia de não ter seu veículo apreendido.
— O projeto interessa à vida e ao cotidiano de milhões de
brasileiros – argumentou.
Para o senador Marcos Rogério (DEM-RO), já está na hora
de reformar o Código de Trânsito. Ele disse que o projeto diminui a burocracia
e moderniza a legislação. Na opinião de Telmário Mota (Pros-RR), o sistema de
trânsito atual está falido e as alterações são importantes. Ele apontou que a
educação é mais eficiente do que a punição e criticou o que chamou de indústria
de multas.
A senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) também defendeu o
projeto, destacando que a educação é essencial para um trânsito seguro. Ela
ressaltou a previsão de escolinhas para crianças sobre a legislação de
trânsito. O senador Chico Rodrigues (DEM-RR) destacou os exames realizados por
peritos e a criação de um cadastro positivo como pontos importantes do projeto.
"Imprudência"
A aprovação da matéria, no entanto, não veio sem
polêmica. Há duas semanas, o projeto já havia sido retirado de pauta, por
falta de consenso em torno do texto. Os senadores Fabiano Contarato e Mara
Gabrilli (PSDB-SP) apresentaram um requerimento para que a matéria fosse
debatida nas comissões de Assuntos Sociais (CAS), Direitos Humanos (CDH) e de
Infraestrutura (CI). O senador Antonio Anastasia (PSD-MG), que presidia a
sessão, rejeitou o requerimento, alegando que, conforme as normas para a
pandemia, as matérias são apresentadas diretamente no Plenário.
Para o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), seria prudente
deixar a discussão para outro momento, em que especialistas pudessem ser
ouvidos. O senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) disse que aprendeu, ao longo
de seus anos como policial rodoviário, que velocidade e imprudência não
combinam. Ele apontou que o projeto “está vindo muito rápido e sem prudência”.
O senador ainda criticou o que chamou de privilégios para motoristas
profissionais, previstos no projeto, e sublinhou que a saúde desses
profissionais é importante para toda a cadeia do trânsito.
O senador Jean Paul Prates (PT-RN) destacou que não houve
nenhuma discussão em comissão ou com especialistas. Ele ainda lembrou que, em
meio a uma pandemia, não há razão para a pressa na votação do projeto e sugeriu
analisar a matéria com calma e serenidade. O senador Major Olimpio (PSL-SP) pediu
mais tempo para amadurecer as alterações propostas. Ele disse temer que o
número de mortes no trânsito aumente no país em decorrência da nova legislação
e lamentou o fato de a matéria ter levado um ano na Câmara dos Deputados e ser
votada às pressas no Senado.
Mortes no trânsito
Mara Gabrilli afirmou que seria importante ampliar a
discussão sobre as mudanças. Ela citou uma pesquisa que coloca o Brasil como 3º
país no mundo com mais com mortes no trânsito. A senadora ressaltou que 20
pessoas por hora entram em hospitais públicos como vítimas de acidentes de
trânsito no Brasil. Mara Gabrilli acrescentou que 60% das vítimas dos acidentes
de trânsito são jovens, com idade entre 15 e 39 anos. Ela apontou também o
custo econômico desses acidentes, já as vítimas retiradas do mercado de
trabalho, que geram custos para a Previdência e a saúde pública, causando
grandes prejuízos pessoais e econômicos.
— No trânsito, eu prefiro ficar com a cautela do que com
a imprudência, que um dia me deixou tetraplégica. Eu sou uma vítima do trânsito
e seria imprudente de minha parte não fazer esse alerta — declarou a
senadora.
Luto
Outro requerimento, do senador Randolfe Rodrigues
(Rede-AP), pedia o adiamento da votação da matéria. Ele alegou não entender
essa “insistência danada” para votar o projeto no meio de uma pandemia. O
senador ainda cobrou mais debates sobre o assunto e lembrou que a legislação de
trânsito avançou nos últimos anos para poupar vidas.
— Isso não é prioridade para o Brasil no momento. Façam
isso, não! As alterações propostas só vão matar mais gente — alertou o senador.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) também criticou a
urgência na votação da matéria. Ela lembrou que trabalhou como médica e viu que
a maioria das vítimas de trânsito que procuram os hospitais públicos são de
pessoas de baixa renda — o que ampliaria o sofrimento com os acidentes. Para a
senadora, educação é importante, mas a punição também tem seu valor nas
questões do trânsito.
O senador Lasier Martins lamentou o aumento do número de
pontos para a suspensão da carteira. Na visão de Lasier, algumas alterações
podem servir de estímulo às infrações no trânsito. Fabiano Contarato também
criticou a votação da matéria. Ele informou que o Brasil registrou mais de 40
mil mortos e 300 mil mutilados em decorrência de desastres no trânsito no ano
passado e classificou o projeto como “antivida” e “famigerado”.
— Infelizmente, no Brasil, em matéria de trânsito, o
único condenado é a família da vítima. Agora, vamos aumentar de 20 para 40 a
pontuação para perder a carteira? A quem interessa a reforma da legislação do
trânsito? — questionou o senador.
Conforme informou Contarato, nem 2% dos motoristas têm
carteira suspensa. Assim, segundo ele, as alterações são para beneficiar uma
minoria que dirige cometendo infrações. Ele também lamentou o fato de o exame
de saúde passar a ter validade de 10 anos e afirmou que as estatísticas “têm
rosto e têm história”.
— Não vai ter minha digital nesse projeto. O Senado está
se apequenando. Este é um momento de luto e eu queria pedir, às vítimas do
trânsito, perdão pelo que o Senado está fazendo — afirmou Contarato, que ao fim
da votação teve uma de suas emendas acatada, para impedir penas alternativas
para motoristas alcoolizados causadores de acidentes graves.
Apesar dos vários apelos, o requerimento pelo adiamento
foi rejeitado por 39 votos a 30.
Fonte: Agência Senado
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