É inevitável concluir que, de fato, o atual grupo de
líderes é, com algumas exceções, patético e preocupante.
Dr Moisés Naím |
O artigo “Problemas grandes, líderes pequenos”, reproduz
a opinião de Moisés Naím, publicado pelo El País. O Dr Moisés Naím tem
trabalhos publicados no The New York Times, The Washington Post, Newsweek,
TIME, Le Monde, Berliner Zeitung e muitas outras publicações internacionalmente
reconhecidas. É Membro do conselho de administração da Open Society
Foundations, do Conselho de Relações Exteriores, do Conselho do Atlântico, do
Diálogo Interamericano e do Fórum Econômico Mundial. Seu
trabalho premiado é altamente influente no mundo da política internacional,
economia e negócios. Em 2005,
Illicit foi selecionado pelo Washington
Post como um dos melhores livros de
não-ficção do ano; foi publicado em 18 idiomas e é a base de um documentário da
National Geographic, premiado pelo Emmy
. Em seu livro de 2013, The End of Power, o ex-presidente dos EUA Bill Clinton
disse que "mudará a maneira como você lê as notícias, a maneira como pensa
sobre política e a maneira como vê o mundo". Arianna Huffington,
presidente do Huffington Post , disse que é "uma perspectiva convincente e
original sobre as surpreendentes novas maneiras pelas quais o poder é
adquirido, usado e perdido - e como essas mudanças afetam nossa vida
cotidiana".
Henry Kissinger pensa que o mundo não será o mesmo depois
do coronavírus. “Estamos passando por uma mudança de época”, diz o famoso
diplomata, para depois nos alertar que “o desafio histórico para os líderes de
hoje é gerir a crise e ao mesmo tempo construir o futuro. Seu fracasso nessa
tarefa pode incendiar o mundo.”
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres,
disse que a relação entre as grandes potências nunca foi tão disfuncional
quanto agora, acrescentando que o coronavírus “está revelando dramaticamente
que devemos nos unir e trabalhar juntos ou seremos derrotados pela pandemia”.
Segundo Martin Wolf, prestigioso editor e colunista-chefe de economia do jornal Financial
Times e professor honorário da Universidade de Nottingham: “Esta é a maior crise que
o mundo enfrenta desde a Segunda Guerra Mundial e também é o desastre econômico
mais grave desde a depressão dos anos trinta. O mundo chegou a este momento
quando existem enormes divisões entre as grandes potências e quando o nível de
incompetência nos mais altos níveis governamentais é espantoso”.
Há muitas coisas que não sabemos. Quando teremos uma
vacina? Qual será o impacto do vírus nos países pobres onde a superlotação é a
norma e ficar em casa sem trabalhar é impossível? O que acontece se a covid-19
vai e vem em diferentes ondas? Mas a pergunta mais preocupante é se aqueles que
nos governam estarão à altura. Martin Wolf conclui: “Não conhecemos o futuro.
Mas sabemos como deveríamos tentar moldá-lo. Conseguiremos fazer isso? Essa é a
pergunta. Tenho muito medo da resposta”.
Falar mal dos líderes políticos é normal. Assim como
criticar sua gestão. Mas é preciso ter cuidado com o desdém pelos Governos. A disputa
política faz com que a inaptidão e a corrupção daqueles que nos governam sejam
exageradas. Governar, vamos reconhecer, é difícil, e está ficando cada vez mais
difícil. O poder se tornou mais fácil de obter, mas também mais difícil de usar
e, portanto, mais fácil de perder. Às vezes parece que não há como um líder
sair bem depois de dirigir um país. Em vez disso, vemos frequentemente líderes
honestos e bem-intencionados cujas reputações foram massacradas por seus
críticos. E, como sabemos, neste século os ataques políticos são
potencializados pelas redes sociais, os bots, os trolls e outras ervas daninhas
cibernéticas. É aconselhável sermos cautelosos e prudentes ao criticar nossos
governantes.
Tenho tudo isso em mente ao pensar nos líderes que estão
no comando do mundo hoje. Apesar dessa cautela, no entanto, é inevitável
concluir que o atual grupo de líderes é, de fato, com algumas exceções,
patético e perturbador.
Quando a crise financeira global eclodiu em 2008, quem
estava no comando do G20 era Gordon Brown, o então primeiro-ministro britânico.
Este ano é a vez do rei da Arábia Saudita, que devido à idade avançada e saúde
precária delegou o papel ao filho Mohammad bin Salman. Sim, ele mesmo. O que
mandou esquartejar um jornalista que o criticava. Este é o líder que deve
convocar, mobilizar e coordenar a comunidade internacional para enfrentar o
coronavírus e suas consequências econômicas.
Nos EUA, o Conselho Nacional de Economia é a principal
fonte de ideias e políticas econômicas do presidente. Desde a sua criação, em
1993, foi liderado por alguns dos economistas norte-americanos de maior
prestígio. Donald Trump nomeou Lawrence Kudlow, cuja credencial mais conhecida
para o cargo foi ter sido comentarista de assuntos econômicos na televisão.
Este não é um caso isolado. O Governo Trump não se destaca pela capacidade e
experiência de seus altos funcionários.
Na Europa o panorama em relação à confiança suscitado
pelos que hoje estão no poder tampouco é muito inspirador. Uma das coisas de
que precisamos dos governantes nestes tempos é que tenham bom senso. Quanta
certeza sobre o futuro dão a você as ações e o bom senso mostrado até agora por
Boris Johnson, Viktor Orbán, Pedro Sánchez, Pablo Iglesias e Luigi Di Maio? No
mundo em desenvolvimento, Jair Bolsonaro, Andrés Manuel López Obrador e Daniel
Ortega estão no noticiário por terem negado a pandemia; o presidente filipino,
Rodrigo Duterte, por ter ameaçado matar aqueles que não respeitassem a
quarentena, e Narendra Modi por usar a desculpa do vírus para aprofundar a
discriminação contra os muçulmanos na Índia.
Não quero romantizar o passado, nem sugerir que os
líderes de antes sempre foram melhores. Houve de tudo. Tivemos Hitler e
Churchill, Mao e Mandela. Mas não há dúvida de que essa pandemia surpreendeu o
mundo em momentos de grande fragilidade institucional. As crises fecham muitas
portas, mas também abrem outras. Esta crise terá muitas consequências
inesperadas. Talvez uma delas seja uma forte reação contra os governantes
pequenos e a chegada de líderes que estejam à altura dos grandes problemas que
temos.
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