terça-feira, 8 de outubro de 2024

Um jeito de ser nordestino

 Gazeta da Torre

08 de outubro – Dia do NORDESTINO

Nordeste, que é Norte, sentido a se buscar na vida, e Leste, orientação de onde se vem. Nordeste, primeiras terras avistadas pelos que achavam que haviam “descoberto” algo por aqui... Nordeste, onde o sol brilha primeiro, nosso Japão brasileiro. Nordeste, cujos sítios arqueológicos piauienses já apontam para a presença dos primeiros humanos das Américas, há mais de quarenta mil anos... Nordeste, quem te viu, quem te vê? Quem te enxerga por outros jeitos de ser?

Nordeste, meu chão e coração – de onde vim e o que sou. Ser nordestino é ter raiz forte do bioma catingueiro, vagar valente por intrincadas veredas, crescer pela terceira margem do rio da existência, florescer e frutificar em meio a vidas secas, com um dom extraordinário e criativo para sobrevivências.

Nordestino, social, poética e quase que biologicamente falando, um camaleão, de tanta luta r-evolutiva, mestre da arte da adaptação. É arquétipo manifesto em sete cores de catavento, padrões de mosaicos em movimento, tradição preservada de formas variadas, caminho com encruzilhadas de Exu em mil direções, por onde passam e repassam mensagens de Hermes, em reverberações de sensos e modos de escrever, ler, ver, interpretar, ouvir, traduzir, transformar, reformar. É ter que dar seu jeito, muitas vezes mil jeitos, de camuflar, resistir, re-viver, enganar o existir para ser. É conjugar na vida o verbo nordestinar.

Nordestino é saber de onde se vem, nem sempre para onde se vai – mas vai, assim mesmo –, pronto a encarar, resiliente e corajoso, até onde indicar o novelo de sua sina. É entender-se nor-destino. Abraçar quem e o que se é, num exercício existencial, antropofágico, de consciência de, e com, classe – retinindo o galope do martelo do preconceito nas cordas de prata da viola, rimando suas dores com revoltas métricas de cordéis e cantorias, entoando as pancadas da vida na pele de bode mágica do pandeiro, fazendo-se em mil pedaços de uma devotada oferenda à Vida, realizando seu sacrifício cotidiano em forma de versos claros e improvisos certeiros, com sentimentos de dor misturados aos de honra e glória pela luta, entre derrotas e vitórias. É, num único ser quimérico, concretizar-se rei de si mesmo, guerreiro em defesa dos fracos, mago revolucionário da história, amante do bem de toda a humanidade. É ser deus e o diabo na terra do sol, um santo guerreiro contra o dragão da maldade.

Ser nordestino é cumprir um destino, sem desatino. É o cabra saber mirar fundo nos olhos do viver e subir nos cascos, ficar de pé, quase arregalando os olhos de altivez e comprimindo os lábios de coragem, não arredar para se fazer respeitar, usando boas e poucas palavras, se for o caso, cerrar os punhos, puxar duma peixeira, vociferar, morder, meter cornos e coices nas adversidades, e ganhar, na lei ou na marra, o que é seu. É que cabra não é da mesma espécie que ovelha... É de outra natureza: cabra dá o sangue para não dar a pele, o que explica seu pensamento, seu sentimento, seu comportamento – de uma só palavra, um só coração, uma só atitude – tudo o que uma vez dito, sentido e feito, não tem volta. É cumprir-se, com riso coringa de canto de boca, enquanto crava sua seta objetivada em alvo certo, pena de poeta, espada de guerreiro, na meta da vida. Em ponto.

 Pronto! Nordestino é isso. E mais isto...

*Trechos do artigo ‘Um jeito de ser nordestino’ de Max Müller, Mestre em Literatura e poeta nordestino

- divulgação -

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