Gazeta da Torre
Por que persistem a avaliação negativa do modus operandi
da Câmara dos Deputados e a percepção de afastamento da Casa em relação à
sociedade? Para a cientista política e escritora Argelina Cheibub Figueiredo,
apesar de cada um eleger o seu deputado, as decisões dependem de mais de 500
parlamentares. “As pessoas não têm confiança na capacidade de os outros
escolherem. Isso tem a ver com uma visão elitista de que o pobre não sabe
votar”, defende a professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Além disso, o Legislativo é muito mais transparente do
que o Executivo, e a “luta” legislativa entre oposição e governo tem, por fim
(no caso da oposição), expor cada vez mais tudo aquilo que é contra, explica.
“É até meio paradoxal. Quanto mais democrática uma sociedade em termos de
transparência, de accountability, e de visibilidade das decisões, menor a
confiança da sociedade. É o que acontece com a percepção de corrupção”, pondera
Argelina.
Em entrevista ao UM BRASIL , uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a cientista analisa a atuação da Câmara dos Deputados – órgão principal de representação do povo – e sua relação com o governo federal.
(https://www.youtube.com/watch?time_continue=5&v=1lGvzUrqqVA&feature=emb_title)
Argelina defende que a Câmara é decisiva para os
resultados Legislativos, e até mesmo em um contexto mais amplo – ou seja, de
democracia. “Existe sempre uma tensão e uma busca incessante de um equilíbrio
entre representação e o que se chama de governabilidade. Pela representação, o
Legislativo, na forma da Câmara, tem de refletir preferências do eleitorado,
sendo responsivo a elas. Da parte do Executivo, é preciso garantir um governo
que não seja totalmente inepto, ineficaz ou omisso; ele tem de fazer políticas
públicas e depende desta articulação.”
Com isso, a organização interna do Legislativo, bem como
sua distribuição de poderes, será muito importante para esta articulação. “A
ideia antiga de que o presidente se relacionava com 513 deputados individualmente
já caiu por terra há muito tempo. Se não houver uma distribuição de poderes
entre partidos dentro e fora do governo e as lideranças, não há um processo
decisório que chegue a termo. Mais formalmente, trataria-se de um ciclo de
decisões que vão se anulando”, ressalta. Neste sentido, o contexto
institucional – que envolve presidência da Câmara e líderes do governo, da
minoria e partidários – tem papel fundamental na articulação com o Executivo.
Ela também explica que o presidencialismo brasileiro (de
coalizão) dispõe de determinadas características não peculiares ao
presidencialismo, mas aos governos de coalizão. “Quando um governo é
minoritário na busca por produção de políticas, precisa formar maioria para
deixar de ser um ‘não governo’. Uma coalizão de governo é uma forma de
comprometer os partidos, e não somente parlamentares, a fazerem parte dele. O
compromisso deve ser entre o partido e o governo.”
A cientista política ainda pondera que a principal razão
da dificuldade de governabilidade não é o número de partidos, mas o alinhamento
político da composição da Casa legislativa. Ela reforça que é preciso ver qual
o espectro ideológico desses partidos, de forma que a situação mais difícil de
se governar seja quando há dois partidos radicais, nos extremos.
“Quando o ‘meio’ está esvaziado, é impossível governar.
Acredito que isso tenha sido uma boa parte do que aconteceu em 1964. Quando há
um centro razoável, isso facilita a governabilidade. Fernando Henrique Cardoso
fez uma coalizão de centro-direita contígua ideologicamente, e com um número
muito grande de pequenos partidos por fora [da base] votando com o governo”,
conclui.
Fonte: UM Brasil
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