Gazeta da Torre - Texto de Márcio Nilo
![]() |
Mercado da Madalena |
Uma característica interessante que diferencia Recife de
outras cidades e capitais brasileiras é a sua peculiar cultura de mercados
públicos de bairros. Nas capitais brasileiras que tivemos a oportunidade de
conhecer nota-se a presença marcante de um mercado central, por vezes de
grandes dimensões, que representa uma referência importante para toda a cidade.
Em Recife, porém, além do Mercado de São José, com sua
bonita arquitetura, que poderia ser considerado o nosso “mercado central”,
contamos com mais 16 mercados públicos, localizados em diferentes bairros e
comunidades recifenses. Cada um deles assume uma personalidade e um perfil
próprio, fazendo parte indissociável da nossa paisagem urbana e cultural.
Muito já se comentou e escreveu sobre os aspectos
históricos e sociais, bem como sobre a importância destes mercados públicos de
Recife para a própria identidade cultural da cidade. Nunca é demais lembrar que
tais espaços, se no início se caracterizavam como simples empórios para a
compra e venda de mercadorias da terra, ao longo do tempo foram adquirindo uma
personalidade mais ampla, assumindo sua vocação de verdadeiros “espaços de
convivência”, onde turistas, gente do povo, intelectuais, políticos etc., vão
em busca do lazer, de atrações culturais, da comedoria e da boêmia.
Portanto, a importância dos mercados públicos recifenses,
como reveladores dos hábitos, dos costumes e da própria natureza das pessoas
das comunidades a que servem, é um consenso entre todos os observadores da
paisagem urbana e social da nossa cidade. Gostaria de destacar, porém, além
disso, dois aspectos que julgo importante comentar sobre estes interessantes
espaços públicos. O primeiro seria o caráter de “aglomerador de gente” que um
mercado público assume. O outro aspecto seria a forma mais generosa com que o
exercício da convivência e da tolerância é praticado nestes espaços. Explico-me
a seguir.
Em recente matéria veiculada em jornal de grande
circulação do estado, conhecido acadêmico,
discorrendo sobre aspectos urbanísticos do Recife, citou a expressão “aglomerador de gente” como
sendo uma característica necessária e desejável para os espaços públicos de uma
cidade. A análise do referido professor afirmava, entre outras colocações
interessantes, que as formas mais
modernas de abastecimento (supermercados e hipermercados), bem como os grandes centros comerciais que
surgiram nas últimas décadas (shopping centers), em que pese a sua atratividade
massiva para a atividade da compra e venda de mercadorias, são espaços
impessoais, que não favorecem muito a
convivência e a interação cotidiana das pessoas.
Além disso, afirmo eu, não são
reveladores de uma cidade, dos costumes de um povo, dos seus hábitos, da sua
cultura, isto porque, como sabemos, Shopping Center tem a mesma cara aqui, na
China e em qualquer lugar do mundo.
Um mercado público servindo um bairro ou comunidade é a
própria antítese desta situação. Este local, que poderia ser considerado
desprovido de requinte e do conforto moderno, é o verdadeiro espaço
“aglomerador de gente”, onde se consegue
uma verdadeira imersão na cultura e no cotidiano local. Vejamos o exemplo do MERCADO DA MADALENA: a vida fervilha
nele e nos seus arredores, com a presença dos comerciantes, clientes, lavadores
de carros, taxistas, vendedores de amendoim, camelôs vendendo suas bugigangas,
além dos tradicionais “malucos” e personagens folclóricos etc. Nos boxes do mercado, constatamos aquele
interessante e diversificado “mix”: frutas e verduras, peixe, carne, armarinhos, queijos, artesanato, carne de
sol, produtos para pássaros e outros animais etc. Encontramos (quase) tudo.
O que não encontramos na verdade não estávamos precisando
mesmo, ora bolas! Nos fins de semana vemos a apresentação de cordelistas,
manifestações folclóricas, escritores lançando seus livros, forrozeiros e
artistas em geral, além da realização de eventos especiais, tais como a eleição
do “corno do ano” etc., etc. Não poderíamos deixar de mencionar, é claro, os
restaurantes e bares do mercado e no seu entorno (viva o Tom Marrom e sua
eclética confraria!), que podem ser considerados, nos fins de semana, as
principais atrações do mercado. Neles temos o melhor da culinária regional com
preços acessíveis, além de descontração, alegria e muita conversa jogada fora.
Nas madrugadas dos sábados chegam aqueles grupos vindos de outras festas, de
outros eventos que já acabaram, mas que estes boêmios se recusam a acreditar, e
buscam no mercado a(s) saideira(s) e um bom cuscuz com galinha guisada, para
repor as energias. Tudo isto agrega,
aglutina, socializa, convida “gente” e incentiva a convivência.
Outro aspecto a destacar é a convivência democrática e
tolerante por parte dos frequentadores destes espaços. Vemos uma mistura de
pessoas de todas as cores, credos e classes sociais numa convivência amigável e
aconchegante. As conversas podem ter os mais variados temas, desde um gracejo
sobre um time de futebol até a situação política mundial. As mesas dos bares são compartilhadas por
intelectuais, gente do povo, trabalhadores humildes, juízes, turistas etc., formando um ambiente catalisador de uma
convivência fraterna e tolerante. Entendo que cada um destes atores sociais
mencionados promovam um “ajuste” no seu discurso e na sua postura,
para que o diálogo flua e o entendimento entre as partes venha a ter um bom
termo. O que constatamos, na verdade, é que todos exercemos uma tolerância que,
acredito eu, fora deste espaço descontraído e democrático que é um mercado
público, não seria praticado dessa forma e com essa generosidade.
Mercados públicos de Recife: estes são os nossos
verdadeiros “Shoppping Centers”, pois nos seus “mix”, eles têm alma e poesia!!!
Muito bom saber dessas informações.
ResponderExcluirChega a ser bastante interessante visitar o mercado com a família e amigos. Uma boa opção para os finais de semana.
ResponderExcluir