Gazeta da Torre
Praia de Boa Viagem, Recife/PE |
Paulo Saldiva, Médico patologista e professor da
Faculdade de Medicina – USP, teme que seja muito tarde para fazer uma proteção
completa da população, mas ainda é tempo de começar.
Eu vou retornar a um tema que abordei muitas vezes, que
são as ondas de calor que estão vigentes no Brasil e se tornarão mais
frequentes e talvez mais intensas ao longo do próximo verão. Acho que todo
mundo desta vez sentiu um enorme desconforto que nos causa problemas para
dormir, nos causa uma dificuldade e uma espécie de mal-estar para executar as
nossas tarefas. Mas o que para alguns é um mal-estar e uma dificuldade de sono,
para outros significa agravamento das doenças crônicas, especialmente doenças
cardiovasculares, doenças respiratórias, doenças renais. Esse agravamento pode
ser de tal ordem que necessite uma internação, como tem aumentado na cidade de
São Paulo e aumentou nesses dias extremos que experimentamos, e infelizmente de
mortalidade.
Bom, se alguém precisava de uma demonstração prática da
necessidade de combater as mudanças climáticas e de investir em infraestrutura
urbana para reduzir os efeitos, essa lição já nos foi dada, fazendo-nos sentir
na pele, literalmente, o calor e o desconforto que ele trouxe.
Talvez com essa sequência de eventos nós tenhamos
condições, um argumento suficiente para mudar políticas urbanas e redirecionar
recursos, porque seguramente não vai haver consenso entre os diferentes
segmentos da sociedade. O solo, o uso e ocupação do solo, como colocar árvores,
como reduzir a temperatura dentro dos coletivos, onde quem utiliza sofre
bastante, pela proximidade das pessoas e porque nós vamos ver que o asfalto, o
leito carroçável, além de ser uma fonte de emissão de poluentes, uma fonte onde
se concentra os poluentes de curta permanência com partículas de gases, o
asfalto, pelas suas características, funciona como um acumulador de calor,
fazendo com que a temperatura, para todos aqueles que se deslocam pelas
cidades, seja particularmente alta. Bom, eu acho que é possível, mas a gente
até agora fez muito pouco e eu temo que tenha sido muito tarde para fazer uma
proteção completa da população, mas nunca é tarde para começar.
Fonte: Jornal da USP
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