Gazeta da Torre
O brasileiro faz festa para tudo, sempre arranja um
motivo para comemorar. Mas é no CARNAVAL que ele festeja a si próprio, pois
quando isso acontece emerge claramente a velha ideia de que a festa representa
uma memória e uma comunicação expressa por mensagem, no dizer do antropólogo
Carlos Brandão. E se nos festejamos estamos cerimonialmente separando aquilo
que deve ser esquecido (o silêncio não-festejado do cotidiano) e aquilo que
deve ser resgatado. Quando nos festejamos somos convocados à evidência, para
sermos lembrados por algo ou alguém, o que significa darmos sentido à vida, através
de ritual na brevidade de um momento especial em que somos anunciados com
ênfase. Aí nos tornamos símbolos, porque a sociedade festeja alguém que
transitou de uma posição a outra ou migrou de trabalho ou de seu espaço de vida
para outro.
Quando alguém, independentemente da mídia, tem seus
quinze minutos de fama, pode estar solenizando uma passagem ou comemorando sua
própria memória. A festa quer ser a memória viva dos seres humanos. A cada ano
eles renovam essa catarse ao brincarem com os sentidos e os sentimentos, e
então inventam situações onde a cultura nacional evidencia uma permanente
vocação de investir no exagero, na critica e até na caricatura. Ali a oculta e
difícil realidade surge epifanicamente revelando o que os indivíduos querem,
fantasiados ou não, sóbrios ou loucos, juntos ou conflitantes, mas festejando o
que são com suas angústias e significados.
No CARNAVAL os atores sociais saem da rotina e forçam ao
ritual da transgressão, saindo de si mesmos no breve ofício de inverter o que
são. Alguns estudiosos como Da Matta e o próprio Brandão chamam isso de espelho
invertido do que é socialmente esperado: pobres se vestem de príncipes, os
nobres de índios, os homens de mulheres, as mulheres viram fadas e os bandidos
querem ser heróis. Condutas se ultrapassam e se comemoram no ritual de si mesmo
no CARNAVAL.
Mas não é o objetivo deste artigo fazer uma análise mais
acurada do CARNAVAL. Ele, o CARNAVAL, vai muito além do seu significado
sociológico. E como cultura, qualquer mecanismo inerente a ele traz uma
dimensão que nos permite o mais profundo pensar.
*Fernando Canto, escritor, doutor em sociologia e folião boemista
--- divulgação ---
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