Gazeta da Torre
Na transição entre o êxito do primeiro álbum e a
preparação do segundo, a rainha da sofrência pop vive o ‘meiostream’ enquanto
se prepara para apresentar aos fãs uma persona mais madura e feliz
A mulher perdidamente apaixonada, a última romântica, uma
egoísta. A adepta de um amor bem gostosinho e sem compromisso, mas que clama
pertencer a um tempo contrário ao presente, onde os amores são para sempre. Nos
pouco mais de dois anos de carreira, Eduarda Bittencourt, de 33 anos, a Duda
Beat (brincadeira com beat do movimento Mangue Beat que, assim como ela, é
natural de Pernambuco), vem entoando as dores e delícias de uma geração de
sentimentos intensos e intermitentes. Sofre-se, mas se chora dançando.
Nas 11 faixas de Sinto Muito — um trabalho independente
com produção de Tomás Tróia, seu guitarrista e hoje seu marido, e com Lux,
tecladista, e que abriga o hit Bixinho — com x mesmo —, Duda canta as
desilusões de uma mulher que, como ela mesma diz, transborda um amor não
correspondido. A primeira frase do álbum, da música Bédi Beat, já mostra de
cara sua intensidade: “eu vivia à flor da pele, nem percebia que das vezes que
eu ria era vontade de chorar”.
Mas se a Beat fever ainda não afetou o seu sistema imunológico,
talvez te passem despercebidos alguns detalhes, como o fato de que, apesar de
ter sido catapultada ao posto de rainha da sofrência pop pela estética nada
discreta e música exuberante, foi no silêncio que Eduarda se deu conta de que o
seu futuro não estava nas elucubrações a respeito do ethos que tinha na
Faculdade de Ciência Política que frequentava à época e muito menos na
Medicina, sonho antigo que lhe roubou sete anos de aulas em cursinhos de
pré-vestibular.
Depois de sucessivas decepções amorosas e um futuro ainda
turvo no quesito carreira, por indicação de uma amiga, se matriculou em um
retiro de meditação onde passou 10 dias em completo silêncio. Foi então,
absorta em seus pensamentos, que Eduarda se deu conta que o seu gosto duvidoso
para homens ligados à música na verdade escondia uma forte ligação dela mesma
com a primeira arte. “Foi uma iluminação: se eu sempre me apaixono por músicos,
eu devo gostar desse mundo, do palco. Então vou fazer isso para viver”. Nesse
caso, o amor foi correspondido.
Sem nunca ter escrito uma canção sequer, saiu do retiro
com a ideia já fixa na cabeça. Entrou em contato com o músico Tomás Tróia —na
época, apenas um amigo—, e o convidou para que ele produzisse aquilo que a sua
cabeça ainda marinava. “Todo mundo já amou sem ser correspondido, já levou um
pé na bunda. Foi uma coisa que realmente veio do coração, acreditava que aquilo
ia tocar as pessoas e que elas sentiriam empatia”, conta.
Veio ao mundo, então, a Duda Beat nos termos que hoje se
conhece: a loira platinada, sempre de gloss nos lábios, acessórios neon e
figurinos que poderiam ser aproveitados em desfiles do Met Gala, que canta toda
a enxurrada de sentimentos que transborda pelos gadgets da geração Z. Fazem
parte do primeiro disco versos como “Se não quer/Não me dá like”; “Minha mãe me
ensinou/Que se é pra brincar de amor/Não pode ser desesperada”; e o mais
famoso, “Só mais uma vez não vai fazer diferença”.
A sofrência empoderada rendeu à pernambucana o troféu de
Artista Revelação no Prêmio Multishow e Women’s Music Awards de Melhor Show,
ambos em 2019. No Spotify, as suas músicas somam 100 milhões de plays. O clipe
de Bixinho, de baixo orçamento mas não menos fiel à sua estética, tem mais de
11 milhões de visualizações. Entre as parcerias musicais firmadas, nomes como
Ivete Sangalo, Daniela Mercury, Jaloo e Nando Reis. “Eu sempre tive segurança
em mim. Uma pessoa que tenta Medicina sete vezes não desiste fácil, eu corro
atrás, vou estudar, procuro reconhecer meus erros e aprender. Eu ainda me vejo
nesse lugar de meiostream (gargalha), porque estou fazendo as coisas pouco a
pouco, tenho muito que aprender”, reflete.
Com um novo disco gravado durante a quarentena e com
previsão de lançamento no primeiro semestre de 2021, Duda pretende dar
sequência ao Sinto Muito, para “continuar com esse título de rainha da
sofrência pop”, define ela, aos risos, e canta ao outro lado do telefone, com o
carregado e doce sotaque recifense: “Eu não vou buscar a felicidade em mais
ninguém”. Esse é um trecho de sua canção Bolo de Rolo. “Essa é a frase que me
representa muito, essa coisa de que a gente tem que olhar para gente e se
amar”.
E Duda aprendeu a se amar. Sua relação com a moda, que
vem desde a adolescência, foi uma grande parte desse aprendizado. As mangas
bufantes que oscilam entre cores vibrantes e tons pastel e os grandes laços que
a caracterizam são reflexo do seu “encontro de alma” com seu stylist, Leandro
Porto. “Acredito que a roupa é uma extensão da nossa arte, conversa com a
letra, a melodia, a narrativa que quero contar. Com cada estética, eu comunico
algo ao meu público. Ser mulher no Brasil é sofrer pressão estética o tempo
todo, mas eu lido com isso da melhor forma possível, eu amo meu corpo, não
tenho medo de usar as roupas que eu uso. Sou muito bem resolvida com isso”,
garante.
Ela também não tem medo de se posicionar politicamente
nas redes sociais, seja falando em defesa dos trabalhadores da cadeia produtiva
da música, alguns dos mais afetados pela crise econômica da covid-19, ou
criticando o governo de Jair Bolsonaro pela má gestão no controle da pandemia.
“Me posiciono politicamente porque é muito natural para mim. Eu quero que meu
público saiba que voz ele está seguindo ali, acho que é uma maneira de eles me
conhecerem também”, diz.
Enquanto se mantém ativa e criativa na quarentena,
pensando também formas de ajudar sua equipe —graças à live que fez no Dia dos
Namorados, pôde remunerar a todos—, ela continua trabalhando, já em modo de
despedida, do Sinto Muito. O adeus definitivo talvez seja o clipe de Pro mundo
ouvir. “Essa música é meu xodó, foi a primeira que compus pro disco”,
derrete-se ela.
Fonte: Joana Oliveira, repórter
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