sexta-feira, 12 de outubro de 2018

FELIZ DIA DAS CRIANÇAS

Gazeta da Torre

Brincar na chuva


Era só ouvir o barulho de chuva e saímos de casa para brincar debaixo dela. Não tínhamos medo de ficarmos molhados. O momento era único. Único para se divertir. Pulávamos nas poças formadas pela água e brincávamos de guerrinhas. Corríamos debaixo das trovadas que iluminavam a face repleta de sorrisos. Os adultos da varanda gritavam: "saiam da chuva ou vão ficar gripados!". Quem ligava para possibilidade de ficar doente enquanto o tempo pedia para sermos felizes? A alegria era tanta que não pensávamos no que poderia vim depois. Vivíamos o agora, aproveitando cada gota como se não houvesse uma chuva amanhã.

Toda vez que vejo chuva, lembro da minha infância. Lembro que não havia hora pra parar a brincadeira. Toda hora era hora de brincar. Minha mãe vivia dizendo: "vão brincar enquanto vocês ainda são crianças". Ela insistia e repetia, mas só vim entender a importância dessa frase quando cresci.

Crescer, por vezes, nos forçam a retirarmos o véu colorido da inocência e a encararmos as responsabilidades cinzentas da maturidade. No mundo dos adultos a chuva é vista como sinal de atraso. As pessoas ficam confusas. O trânsito torna-se bagunçado. Os planos para se divertir no dia, a maioria, são cancelados. Uma vez, comentei com uma colega de trabalho que adoraria que a chuva caísse, pois o tempo estava insuportavelmente abafado. No bar, ao lado da empresa que trabalhava, havia uma roda de samba. Ela olhou assustada para mim dizendo: "você está desejando acabar com a alegria daquelas pessoas?". Respondi com os ombros me perguntando em pensamentos que mal haveria em chover e como isso poderia acabar com a alegria dos "adultos". Naquele dia, não choveu e a cidade ficou sem chuva nas outras semanas...

Talvez, eu tenha desejado a chuva naquele dia por motivos egoístas, por interligá-la a uma época tão distante e inalcançável do meu agora... Desejei chegar, naquele dia, em casa e dormir com o barulho acolhedor da água batendo na janela. Desejei e fui atendida. Hoje, choveu. A chuva não só trouxe o frescor para o ar que respiro como também me embriagou de lembranças saudosas da infância em que a única responsabilidade que eu tinha era a de brincar debaixo da chuva sem pensar na possibilidade de ficar doente no outro dia.

Por Michele Nakashima - Crônicas e Contos

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