Gazeta da Torre
Por Hugo Tourinho Filho, diretor da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP) da USP
Brilhante, impactante, disruptiva e paradoxalmente brutal
sem apresentar nenhuma cena explícita de violência… Adolescência é a mais nova
série que figura no topo da lista das mais vistas nas últimas semanas e,
reconhecidamente, como uma das mais inovadoras, seja na forma como foi filmada
(plano-sequência), assim como na maneira que aborda um assunto que vem causando
um profundo incômodo nas famílias, instituições de ensino e na sociedade como
um todo.
Adolescência não é uma série de ficção policial que tem
como objetivo descobrir quem matou, mas instigar uma desafiadora reflexão sobre
por que nossos adolescentes vêm cometendo atitudes extremas, sem um “motivo
aparente”. A chamada geração Alfa (nascidos a partir de 2010) traz preocupações
e enfrentamentos diferentes das gerações nascidas nas décadas anteriores.
Os pais dessas gerações temiam os perigos existentes nas
ruas – o mal a que estávamos expostos nesse ambiente. Hoje esse medo ainda é
real e pertinente, mas para os pais da geração Alfa ainda existe um novo temor,
explicitado na série – o acesso a um mundo desconhecido por nós, localizado
dentro das redes sociais e acessado pelos computadores desses adolescentes, de
seus quartos. Um mundo digital cercado por símbolos (emojis), decifrados apenas
por quem faz parte dessa geração e que colocam as gerações anteriores como
totais analfabetos digitais. Insels, redpills, bluepills, teoria do 80/20,
política do cancelamento, cyberbullying e manosfera são algumas das expressões
que compõem o novo dialeto dessa geração que são nativos digitais e que trazem
características e comportamentos muito específicos.
Na geração Alfa, a exposição à tecnologia e a telas é
muito forte. Com muitos estímulos e acostumados a usar meios digitais para se
entreter e buscar informações, requerem uma educação mais dinâmica, ativa,
multiplataforma e personalizada. Essa geração tem como características a
flexibilidade, a autonomia e um potencial maior para inovar e buscar soluções
para problemas de forma colaborativa. Gostam de ser protagonistas, colocar a
mão na massa e aprender com situações concretas.
A geração Alfa não escreve mais cartas, manda mensagens
pelo WhatsApp ou pelas redes sociais. Não faz mais diários, posta vídeos no
TikTok, ou propaga suas ideias via X (antigo Twitter). As pesquisas já não são
mais feitas em enciclopédias, mas sim no “Senhor Google”.
As gerações Baby Boomers e X, que predominam entre os
docentes que atuam no ensino superior, foram educadas a utilizar um equipamento
novo somente depois de terem lido todo o seu manual, com o temor de quebrá-lo
se esta regra não fosse cumprida. Na geração Alfa o raciocínio é completamente
inverso, ou seja, é necessário explorar um equipamento novo, livremente, para
poder aprender como se usa – é a cultura Touch, que exemplifica muito bem a
necessidade desta geração participar ativamente do processo para poder
aprender. O fato é que a geração Alfa precisa ser protagonista do processo para
que haja o seu engajamento. Diante desse cenário de possível conflito de
gerações, o uso das metodologias ativas passa a ser uma possibilidade muito
interessante para aproximar mundos tão distantes e diferentes.
Numa atualidade em que somos desafiados a nos
(re)inventar como docentes e as atividades remotas de ensino passaram a ser uma
nova possibilidade, o uso de metodologias ativas tornou-se uma estratégia muito
interessante, na medida em que busca tornar o processo ensino-aprendizagem mais
atrativo para as novas gerações que buscam o protagonismo dentro do processo
ensino-aprendizagem. Nesse sentido, metodologia ativa é um conceito amplo, que
pode englobar diferentes práticas em sala de aula. Em comum, todas têm o
objetivo de tornar o aluno protagonista dentro do processo, participando ativamente
de sua jornada educativa.
As metodologias ativas de ensino-aprendizagem
compartilham uma preocupação – estimular a participação ativa dos alunos,
tornando-os protagonistas no processo de aprendizagem –, porém, não se pode
afirmar que são uniformes, tanto do ponto de vista dos pressupostos teóricos
como metodológicos; assim, identificam-se diferentes modelos e estratégias para
sua operacionalização, constituindo alternativas para o processo de
ensino-aprendizagem, com diversos benefícios e desafios, nos diferentes níveis
educacionais.
A geração Alfa, com seus símbolos e comportamentos
próprios, escancarados na série Adolescência, atualmente está com seus
representantes mais velhos na casa dos 15 anos e mais dois ou três anos
ocuparão as salas do ensino superior. Será que estaremos preparados para eles?
Seremos capazes de decifrá-los ou seremos devorados?
Um dia, um amigo que também é docente me disse que “os
alunos nunca envelhecem… nós envelhecemos”. Nunca havia pensado nessa
perspectiva, mas concordei, e por isso acredito que cabe a nós procurar
decifrá-los e, desse modo, termos a chance, por meio de nossas experiências de
vida e profissional, contribuir para a formação de líderes para estas novas
gerações e, assim, prepará-los para um mundo coberto de incertezas…
Fonte:Jornal da USP
- anúncio -
Nenhum comentário:
Postar um comentário