Gazeta da Torre
Professora Dora Kaufman |
A Inteligência Artificial (IA) é considerada a tecnologia
de propósito geral do século 21, transformando a lógica de funcionamento da
economia, das empresas e da sociedade — tal como ocorreu com o carvão, a
eletricidade e a computação. A tecnologia avança a ponto de ser implementável
em qualquer indústria, com benefícios extraordinários, mas também com
potenciais danos e questões éticas. Diante disso, como proteger a sociedade dos
riscos sem comprometer o uso estratégico da ferramenta?
Segundo Dora Kaufman, professora do Programa de
Tecnologias da Inteligência e Design Digital na Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP), em entrevista ao Canal UM Brasil, cabe ao Poder
Público regulamentar a IA, processo presente no mundo todo, atualmente.
“Regulamentar a IA não traz nada novo ao funcionamento da sociedade, pois já
vivemos em um ambiente completamente regulado. Aliás, o novo seria ter uma
tecnologia com essa importância sem regulamentação”, afirma.
Contudo, ela acredita ser preciso olhar, primeiro, para o
que já existe no Brasil em termos de regulamentação, como o Código Civil, o
Código de Defesa do Consumidor (CDC), a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e
o Marco Civil da Internet. “E das leis ou normas que já existem, há as
setoriais também. Cada setor tem as próprias normas específicas. Eu continuo
defendendo que deveria ser realizado um estudo para ver como expandir cada uma
dessas regras para incluir as questões relativas à IA”, complementa.
Por outro lado, mesmo que um país defina uma
regulamentação, as normas, sem dúvida alguma, ficarão rapidamente
desatualizadas. “O tempo que se leva para fazer uma lei e discuti-la, realizar
audiência pública e preparar deputados e senadores com literatura sobre o tema
é totalmente diferente do tempo da evolução da tecnologia. Existe um
descompasso, pois em qualquer regime democrático se faz necessário um processo
de discussão.”
Dora comenta que a legislação europeia, por exemplo,
ganhou forma a partir de 2018 e, hoje, tem 485 páginas. Ainda assim, “não está
claro como será implementada uma lei tão complexa e como será fiscalizada. Se
não há um instrumento de fiscalização, não adianta nada se ter a lei.”
Impacto sobre os negócios
A IA generativa, materializada em ferramentas como o
ChatGPT e outras de geração de imagens, impacta as pequenas empresas de forma
diferente de todas as tecnologias anteriores, uma vez que o dispositivo está
ajudando esses negócios a criar conteúdos de um modo que, antes, poderia ser
muito mais custoso ou inacessível. “Uma microempresa, por exemplo, não tem
aparato nem equipe, não se relaciona com agências para produzir um logotipo,
uma campanha, uma imagem para divulgar o produto ou serviço — ou, até mesmo, um
e-mail marketing. Todas essas funções e situações importantes na divulgação do
produto e do serviço das microempresas podem receber uma ajuda enorme, porque,
de repente, têm acesso a uma tecnologia que ajuda a melhorar o que precisam
fazer, e, muitas vezes, de forma gratuita.”
Ainda assim, essas ferramentas não trazem nada de novo,
pois são treinadas em um grande conjunto de dados, buscando soluções
internamente. No entanto, ainda cometem muitos erros — pequenos e grandes —,
destaca a professora. “Portanto, é importante ter conhecimento do assunto ao
interagir com essas soluções para poder corrigir os erros.”
Futuro do trabalho
O reflexo da automação e da IA no mercado de trabalho
também foi outro tópico da entrevista. Há um medo crescente de que a tecnologia
substitua trabalhadores em várias profissões, incluindo aquelas que demandam
mais estudo, como roteiristas, atores, advogados etc. A preocupação não se
limita mais a trabalhos menos qualificados.
Dora esclarece que não há evidência de que profissões
inteiras serão substituídas, mas, sim, as tarefas relacionadas a essas funções.
Ela observa que a automação já ocorre há décadas em setores como a indústria
automobilística e o varejo financeiro. Além disso, ressalta que a nova onda de
automação inteligente vai impactar as tarefas cognitivas. Dessa forma,
“aconselha-se que as pessoas se concentrem em aprimorar as suas habilidades,
pois a tecnologia domina essas funções básicas e será cada vez mais eficiente.”
“Não chegamos ao ponto em que os robôs superaram os
humanos. Não sei se vamos chegar. No entanto, acredito que as pessoas têm de
estar atentas ao fato de que o básico está dominado. Não adianta competir com o
básico, seja qual for a área de atuação do profissional. Prepare-se para fazer
o melhor possível, não o básico”, esclarece.
Fonte: UM Brasil
- divulgação -