sexta-feira, 3 de março de 2023

Merenda escolar ganha mais importância com avanço da fome

 Gazeta da Torre

Todos os dias, 40,3 milhões de crianças e adolescentes se alimentam gratuitamente em escolas públicas de todo o país. É como se, diariamente, o Brasil colocasse um exército de merendeiras para matar a fome de quase toda a população da Argentina. Mas, em meio ao empobrecimento dos brasileiros, com 33 milhões de pessoas passando fome todos os dias, segundo pesquisa divulgada em junho pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), cresce o número de crianças que comem carne ou consomem a única refeição do dia apenas na escola.

O cenário reforça a importância da merenda escolar – que garante a frequência às aulas e o crescimento com saúde. São fartos os estudos mostrando que a alimentação equilibrada está relacionada ao bom desempenho em aula. A fome reduz foco, memória e capacidade de raciocínio. Desnutrida, a criança desenvolve menos conexões neurais – o que, no futuro, pode prejudicar a ascensão social. 

— Há evidências sólidas mostrando a influência entre boa alimentação e desenvolvimento cognitivo e também retenção escolar. A alimentação é uma política pública importante. Nós não podemos dar conta de toda a família, mas ao menos as crianças na escola se alimentam bem. Sem fome, vão ser mais saudáveis, menos obesas, aprender melhor e vão contribuir mais para a sociedade — comenta a nutricionista Sílvia Pauli, coordenadora da alimentação escolar da Secretaria Municipal de Educação (Smed) de Porto Alegre.

Na prática, a merenda escolar funciona como transferência indireta de renda, já que alivia os gastos de brasileiros.

Alimentar 40,3 milhões de crianças é possível graças a uma gigantesca política pública existente há mais de 60 anos, admirada no mundo inteiro, inclusive por países ricos: o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). A estratégia é financiada em parte pelo Ministério da Educação (MEC) e em parte por Estados (no caso da merenda de escolas estaduais) ou por prefeituras (quando a comida é servida em escolas municipais). 

A insegurança alimentar é fruto de duas coisas: desigualdade alta associada com pobreza, ou seja, muitas pessoas pobres em país desigual, e uma rede de abastecimento mal estruturada. O problema da fome no mundo não é falta de alimento, mas distribuição. Temos alimentos o suficiente, o problema é distribuir. Se não ofereço merenda de qualidade, perco a criança do ponto de vista de desenvolvimento. Ninguém estuda com fome — diz José Ely Mattos, professor de Economia na PUCRS.

Por Marcel Hartmann, jornalista

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