Gazeta da Torre
Fonte: DIEESE
(Departamento Intersindical de Estatística
e Estudos Socioseconômicos)

Nos últimos 30 dias, a Petrobras reajustou o preço da
gasolina e do diesel nas refinarias 16 vezes. O preço da gasolina saiu de R$
1,74 e chegou a R$ 2,09, alta de 20%. Já o do diesel foi de R$ 2,00 a R$ 2,37,
aumento de 18%. Para o consumidor final, os preços médios nas bombas de
combustíveis subiram de R$ 3,40 para R$ 5,00, no caso do litro de gasolina
(crescimento de 47%), e de R$ 2,89 para R$ 4,00, para o litro do óleo diesel
(alta de 38,4%). Em atos e interdições de rodovias pelo país, o movimento que
envolve caminhoneiros questiona, entre outros assuntos, a escalada nos preços
dos combustíveis, principalmente no do óleo diesel. O transporte de cargas no Brasil depende
fortemente do modal rodoviário. Em poucos dias de interdições, os impactos já
são sentidos em várias cidades. A população sente dificuldade para obter
combustíveis e começa a perceber problemas para o acesso a outros produtos,
principalmente alimentícios. A mobilidade das pessoas e a prestação de diversos
serviços foram afetadas.
Por que os preços de derivados de petróleo estão subindo
tanto no Brasil?
A escalada nos preços dos derivados no Brasil, neste
momento, está relacionada a fatores de natureza conjuntural (principalmente
devido a elementos da geopolítica do petróleo e valorização do dólar diante do
real) e a fatores internos (escolhas da política de preços adotada pela
Petrobras).
1 - O cenário externo e o aumento do preço do petróleo
Nos últimos três meses, houve crescimento expressivo
(cerca de 23%) da cotação do barril de petróleo no mercado internacional,
principalmente em razão do retorno das sanções dos Estados Unidos (EUA) sobre o
Irã, do aumento geral da tensão no Oriente Médio, envolvendo Israel, Palestina
e Síria, e da queda na produção de petróleo da Venezuela. Irã e Venezuela são
dois grandes países exportadores de petróleo que, ao reduzirem as exportações,
provocam aumento nos preços do barril, influenciando também o dos
derivados. Além disso, desde o segundo
semestre do ano passado, um acordo na Opep (Organização dos Países Exportadores
de Petróleo), entre Arábia Saudita e Rússia, dois importantes produtores e
representantes de polos politicamente opostos dentro da Organização, apontou
para a necessidade de recomposição dos preços (leia-se, aumento da cotação internacional).
Existem ainda dois fortes movimentos especulativos
internacionais: um pela subida dos preços do petróleo, a partir da situação
geopolítica apontada aqui, e, outro, contra as moedas dos países emergentes,
forçando a alta do dólar estadunidense. No Brasil, somado ao cenário de
incerteza política, a valorização do dólar diante do real foi significativa,
com grande impacto sobre os preços internos de produtos importados.
2 - A nova política de preços da Petrobras
Na presidência da Petrobras desde junho de 2016, Pedro
Parente imprimiu uma nova política para a definição dos preços de derivados de
petróleo no Brasil, adotando a paridade internacional. Isso significa que a
Petrobras passou a praticar nas refinarias os mesmos preços dos derivados no
mercado internacional2. Assim, a partir de outubro de 2016, os preços começaram
a sofrer variações mais frequentes e, a partir de julho de 2017, as correções
passaram a ser diárias.
A paridade
internacional de preços veio acompanhada de outras duas decisões, que compõem o
quadro da mudança na gestão da Petrobras: a redução da produção nas refinarias
próprias da empresa e o anúncio da venda de outras quatro no Brasil. Essas
medidas abrem espaço para o aumento da participação de empresas privadas no
setor e a entrada de capital estrangeiro.
Efeitos da política de paridade internacional dos preços
dos derivados
A decisão da Petrobras de praticar a paridade
internacional desencadeou uma série de efeitos sobre a economia brasileira,
afetando diretamente os consumidores e também os setores da indústria que
utilizam os derivados de petróleo para produzir.
1) O país se torna mais vulnerável aos efeitos externos,
reduzindo a capacidade de intervenção sobre os preços. Isso acontece quando o
preço do barril sobe muito (como está acontecendo agora) ou mesmo quando há uma
intempérie em países fornecedores de petróleo ou derivados.
2) O país passa a comprar no mercado internacional um bem
que poderia produzir internamente. A produção de petróleo no Brasil, em abril
de 2018, foi de 2,6 milhões de barris/dia (sem considerar 673 mil barris de gás
natural). Neste mesmo mês, as refinarias da Petrobras processaram 1,6 milhão de
barris/dia e o consumo interno de derivados ficou em 2,2 milhões de barris/dia.
Assim, mesmo produzindo 400 mil barris de petróleo a mais do que o necessário
para atender ao consumo nacional, o país importou cerca de 600 mil barris de
derivados/dia. Isso aconteceu porque a Petrobras está aumentando a exportação de
petróleo cru4 e, ao mesmo tempo, reduzindo a utilização de suas refinarias. As
refinarias da empresa possuem capacidade de refinar 2,4 milhões de barris/dia,
mas estão utilizando apenas 68% dessa capacidade. Além disso, parte dessa
produção de derivados está sendo direcionada para atender ao mercado externo.
3) Como consequência desta política de paridade e redução
da produção, cresce a entrada de importadores de derivados de petróleo no país.
Segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP), hoje existem 392 empresas
autorizadas a realizar importações de derivados no país. Dessas empresas, 129
(33%) foram cadastradas depois de 2016.
4) Na busca pelo aumento da receita fiscal, em julho de
2017, o governo federal reajustou de 9% para 14% a alíquota do PIS/Cofins
(Programa de Integração Social/Contribuição para o Financiamento da Seguridade
Social), que incide sobre a gasolina e o diesel, com impactos ainda maiores
sobre os preços finais.
5) A economia brasileira se torna mais suscetível às
flutuações do mercado financeiro e aos ataques especulativos. Desde a
liberalização e a desregulação financeira no começo dos anos de 1990, os fluxos
de capitais de curto prazo e os ataques especulativos com o objetivo de
direcionar as políticas nacionais têm se tornado elementos decisivos da
economia. Quando se permite que um dos principais bens comercializáveis (e a
principal fonte de energia e de transporte) possa variar conforme os fluxos
financeiros, a economia nacional se torna ainda mais suscetível aos ataques
especulativos. Desta forma, o governo reduz a capacidade de controle sobre a
política econômica.
6) Diante de forte movimento especulativo, ainda que no
curto prazo, ganham enormemente os acionistas privados, boa parte deles de
capital internacional.
Por sua vez, o trabalhador brasileiro, como consumidor
final, sofre um grande impacto no custo de vida, especialmente em contexto das
mais variadas adversidades, como a queda da massa de salários e o aumento do
desemprego no país.
Diante de todos esses efeitos, resta uma simples pergunta:
se o Brasil tem grandes reservas e consegue, hoje, extrair maior quantidade de
barris que o total do consumo nacional, por que o petróleo tem que ser vendido
a um preço tão mais alto que o custo de produção?
Como era a política de preços dos derivados antes da
atual gestão?
Entre janeiro de 2003 e junho de 2016, a Petrobras optou
por manter os preços dos derivados de petróleo mais estáveis, reduzindo o
impacto das flutuações internacionais. Ainda que levasse em conta as variações
dos preços internacionais, utilizava-se de outros fatores como contrapesos,
como os custos e o volume da produção de petróleo e de refinado no país, a
variação da demanda por derivados, entre outros.
Nesse mesmo período, a
gasolina e o diesel sofreram apenas 15 reajustes de preços (para cima ou para
baixo) e, entre 2005 e 2008, não houve nenhuma revisão de valor. O gás
liquefeito de petróleo (GLP), o chamado gás de cozinha, não sofreu nenhum
reajuste em refinaria entre 2003 e 2014. É importante lembrar que o preço do
produto tem grande impacto sobre os custos de alimentação do trabalhador
brasileiro. Não à toa, a recente escalada de preços teve como consequência o
aumento do número de famílias que passou a usar a lenha para cozinhar.
Por
outro lado, com a nova política, desde junho de 2016, a Petrobras já reajustou
216 vezes os preços da gasolina e do diesel. Para dar ideia do impacto, entre
maio de 2017 e abril de 2018, a inflação acumulada pelo Índice de Custo de Vida
(ICV/DIEESE) ficou em 2,79%. O aumento ocorrido no subgrupo transporte individual,
de 11,47%, foi consequência, principalmente, da alta nos preços médios da
gasolina (19,75%), do álcool (15,05%) e do diesel (10,99%); o subgrupo
transporte coletivo, por sua vez, teve elevação de 5,35%.
Medidas que podem mitigar a atual crise
No cerne desse conflito está a disputa sobre quais grupos
ganham e quais perdem com a atual política de preços da Petrobras. Ao que tudo
indica, o consumidor final acaba, literalmente, pagando a conta, já que os
custos de produção (incluindo o transporte) acabam repassados ao preço final,
com maior impacto sobre as camadas médias e mais pobres da sociedade.
Uma eventual redução dos preços dos
combustíveis via diminuição de impostos implica, necessariamente, renúncia fiscal.
Nesse momento de baixa arrecadação e déficit público, em que o financiamento de
políticas públicas já está comprometido, essa solução compromete mais ainda a
capacidade de ação do Estado brasileiro. O corte na Cide (Contribuição de
Intervenção de Domínio Econômico), no PIS/Cofins ou no ICMS (Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços) resultarão em medidas paliativas, se não
houver uma mudança na política do setor de petróleo no Brasil que transforme,
de forma mais estrutural, a dinâmica de preços. Além disso, é um custo que
novamente será pago pela população.
É
fundamental o fortalecimento da capacidade do Estado brasileiro para
administrar as flutuações externas de custos, reduzindo o impacto da dinâmica
geopolítica internacional do petróleo, e, ao mesmo tempo, direcionando a política
interna de preços para o atendimento dos interesses dos consumidores. Como
empresa estatal, a Petrobras deveria ter a atuação voltada para esses
interesses e não favorecer os investidores estrangeiros e especuladores que
ganham em torno da livre flutuação de preços.
As empresas estatais diferem das privadas na medida em
que, pela natureza, deveriam tomar decisões orientadas pelo interesse coletivo
e não apenas por critérios econômicofinanceiros. É possível gerir empresas
estatais de forma eficiente, sob a perspectiva do interesse público. A análise
das experiências de países desenvolvidos mostra a viabilidade de diferentes
tipos de gestão no setor público, com controle social, que possibilitam reduzir
acentuadamente problemas relacionados à corrupção e à apropriação indevida por
interesses privados.
Conforme mostrado na Nota Técnica 1897, do DIEESE, as
empresas estatais cumprem importante papel no atendimento aos interesses da
sociedade. Entre outras funções, desenvolvem setores de atividade econômica e gestão
de recursos estratégicos para a garantia da soberania nacional. Cumprem também
o importante papel no provimento de bens e serviços essenciais à vida, conforme
define inclusive a Constituição Federal de 1988.
Nesse sentido, diante do atual
cenário, algumas iniciativas podem ser adotadas pela Petrobras e pelo governo
federal para tentar resolver o conflito com o movimento que envolve
caminhoneiros, com redução de preços também para a população em geral. Vale
chamar atenção para o fato de que a principal reinvindicação do movimento é a
redução dos preços do diesel.
Medidas:
▪ Recuar da política de paridade internacional nos preços
dos derivados, principalmente diesel, gás de cozinha e gasolina, e levar em
consideração outros fatores, como a produção de petróleo e refino no país,
custos para essas produções, câmbio, demanda por derivados.
▪ Aumentar o volume de petróleo refinado em refinarias
próprias, que atualmente utilizam apenas 68% da capacidade total. Como apontado
anteriormente, é possível refinar 2,4 milhões de barris/dia e atender a demanda
interna (com cerca de 2,2 milhões/dia), dependendo menos do mercado
internacional (seja de produção ou preço dos refinados).
Como estão reagindo os petroleiros
O movimento sindical petroleiro vem discutindo e
apontando problemas nessas escolhas estratégicas da atual gestão da Petrobras
há alguns anos. No caso específico da Federação Única dos Petroleiros (FUP),
foi aprovada, em assembleia com a categoria, uma greve, em fase de organização,
para os próximos dias, cujas bandeiras são:
✓ Redução dos preços dos combustíveis;
✓ Manutenção do emprego e retomada da
produção das refinarias;
✓ Fim das importações de derivados;
✓ Contra a política de privatização da
Petrobras;
✓ Democracia.
DIEESE
Presidente: Bernardino Jesus de Brito Sindicato dos
Trabalhadores nas Indústrias de Energia Elétrica de São Paulo - SP
Vice-presidente: Raquel Kacelnikas Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos
Bancários de São Paulo Osasco e Região – SP Secretário Nacional: Nelsi
Rodrigues da Silva Sindicato dos Metalúrgicos do ABC - SP Diretor Executivo:
Alex Sandro Ferreira da Silva Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias
Metalúrgicas Mecânicas e de Material Elétrico de Osasco e Região – SP Diretor
Executivo: Antonio Francisco Da Silva Sindicato dos Trabalhadores nas
Indústrias Metalúrgicas Mecânicas e de Materiais Elétricos de Guarulhos Arujá
Mairiporã e Santa Isabel – SP Diretor Executivo: Carlos Donizeti França de
Oliveira Federação dos Trabalhadores em Serviços de Asseio e Conservação Ambiental
Urbana e Áreas Verdes do Estado de São Paulo – SP Diretora Executiva: Cibele
Granito Santana Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Energia Elétrica
de Campinas – SP Diretora Executiva: Elna Maria de Barros Melo Sindicato dos
Servidores Públicos Federais do Estado de Pernambuco – PE Diretora Executiva:
Mara Luzia Feltes Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramentos
Perícias Informações Pesquisas e de Fundações Estaduais do Rio Grande do Sul –
RS Diretor Executivo: Paulo Roberto dos Santos Pissinini Junior Sindicato dos
Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas de Máquinas Mecânicas de Material
Elétrico de Veículos e Peças Automotivas da Grande Curitiba – PR Diretor
Executivo: Paulo de Tarso Guedes de Brito Costa Sindicato dos Eletricitários da
Bahia – BA Diretor Executivo: Sales José da Silva Sindicato dos Trabalhadores
nas Indústrias Metalúrgicas Mecânicas e de Material Elétrico de São Paulo Mogi
das Cruzes e Região – SP Diretora Executiva: Zenaide Honório Sindicato dos
Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo - SP
Direção Técnica Clemente Ganz Lúcio – Diretor Técnico
Fausto Augusto Júnior – Coordenador de Educação José Silvestre Prado de
Oliveira – Coordenador de Relações Sindicais Patrícia Pelatieri – Coordenadora
de Pesquisas e Tecnologia Rosana de Freitas – Coordenadora Administrativa e
Financeira
Técnico responsável: Cloviomar Cararine Revisão técnica:
Adhemar Mineiro Iderley Colombini Neto
Jéssica Naime Paulo Jäger